1 – Descoberta
Olhando meu próprio
reflexo.
Encontrando um novo
ser.
Vi minhas marcas e
pensei no que elas significavam. Uma águia estendia-se desde o meu ventre, e
suas asas quase alcançavam meus seios. Tribais angélicos nos braços mostravam a
ordem e a linhagem a qual pertencia.
Toquei em cada
linha. Era quente, mas suave.
E, para isso, eu
precisei conhecer os prazeres da carne. O ato mais descriminado pelos humanos
foi o mais sagrado dos anjos. Ele me trouxe a vida que eu não sabia que tinha o
direito de ter.
— Encantada? – ele
perguntou, abraçando-me por trás.
— Surpreendida. Não
esperava por isso – respondi, enquanto levantava meu braço para alcançar seu
rosto perfeito. – Sempre soube disso?
— Desde que
descobri quem eu era.
— Hazanel? –
inquiri, iniciando meu teste com o demônio.
— Confiando na
sabedoria da Nova Ordem, ou seja, você.
— Meu pai?
— Acreditando. Ele
sempre lutou para fazer de ti a melhor dos herdeiros.
— Persis, e agora?
— Agora veja suas
asas, minha rainha.
Abri meus novos
membros, tão pouco usados para sua real finalidade, tornando-se apenas um
instrumento que eu usava para surpreender meus inimigos. Sempre depositei minha
força nas minhas habilidades de luta, nunca no fato de ser uma criatura alada.
Olhei para os
membros que eu lutava para esconder e eis que me maravilhei com o que descobri:
penas prateadas, jamais vistas.
Diferentes.
Únicas.
Perfeitas.
Sorri.
Eram minhas!
Eu tinha asas, hora
de aprender a voar.
— Prata! –
exclamei, sorrindo.
— A sabedoria é
como prata, saber usá-la é como ouro, Lienne – respondeu-me ele, retribuindo o
mesmo sorriso.
— Por que as suas
são negras?
— O sacrifício que
enegrece a vida de quem o carrega. Meu destino é marcado pelo fim.
Virei e o encarei.
Eu não aceitaria isso, não agora que tinha descoberto toda a verdade, não agora
que meus planos eram outros.
— Podemos mudar
isso, Persis – declarei convicta.
— Como, minha
rainha? Profecias são apenas certezas que temos que aceitar.
— Não, porque eu
não aceito isso. Matarei Liel e a profecia não se cumprirá.
— E comprará briga
com o maior dos arcanjos? Apollyon não é o que parece.
— A força bruta não
vence um bom raciocínio – rebati, gabando-me de um dom do qual jamais fizera
uso por completo. Porém, se tratando do Rei das Trevas, não seria necessária
uma mente dotada de inteligência. – E sabedoria é algo que ele não tem. Confie
em mim, porque eu realmente morreria por você, Persis – menti.
Ele tomou meu rosto
entre suas mãos e depositou um forte e inebriante ósculo em meus lábios.
Perguntei-me como quase deixei essa felicidade escapar... Persis me pertencia,
ele mudou os fatos, mudou minha história, iria se sacrificar por mim e por todos
os outros.
— Agradeço sua
dedicação, Lienne. No entanto, jamais permitiria tal ato - declarou, pousando
um suave beijo em minha testa. – Eu morreria antes.
— Como ficam
Adramalech e Kali? – perguntei, mudando o rumo da conversa.
— Eles são
nephilins.
— Claro, precisam
passar pelo teste – concluí, revirando os olhos.
— Fez um bom
trabalho com Mikael e Sephora, sei que fará o mesmo com eles.
— Caleb fez um bom
trabalho – corrigi –, eu só o representei.
— Que seja. Saberá
como agir. Lembre-se que estarei ao seu lado sempre.
— Leve-me à minha
casa, Persis – pedi. – Para que nossos planos deem certo, preciso continuar meu
teatro com Apollyon.
— Não.
— Como disse? –
inquiri, arqueando as sobrancelhas, sem acreditar que ele fosse mesmo capaz de
me desafiar.
— Eu disse que não,
Lienne. Não quero esse demônio asqueroso com suas mãos sujas no seu corpo. Você
é minha agora, não permitirei tal afronta.
— Meu coração, meus
pensamentos e até mesmo minha dedicação a essa luta é sua. Contudo, o corpo é
meu e faço dele o que bem entender – retruquei com firmeza. – Sabe que essa é a
única maneira de mantê-lo sob nossas rédeas. Portanto, deixe de ciúmes
infundados e me leve para casa.
Suspirando
derrotado, ele respondeu:
— Vista-se.
— Me diga como,
pois meus trajes viraram trapos em suas mãos.
— Aproveitemos o
momento – comentou com malícia, mostrando que seu brio falava mais alto. – Seja
minha uma vez mais.
Um beijo intenso
renovou a chama fraca, deixando meu corpo em brasa, pronta para me entregar
novamente ao melhor prazer de todos, o sexo dos anjos.
As mãos de Persis
percorrendo meu corpo me arrancavam suspiros eróticos.
Ele me jogou em sua
cama, enquanto seus lábios desciam, marcando cada centímetro do que agora lhe
pertencia. Éramos iguais, com as mesmas marcas. Amantes desenhados em perfeita
sincronia.
Subitamente, fui
possuída, permitindo sem frescuras que ele me tomasse, enquanto nossos olhos se
fixavam em um fitar promissor.
“Divino prazer, por que fugi de ti por tanto tempo?” – inquiri mentalmente.
Meu sacrifício, meu
amado, meu amante... Tudo nele era perfeito. Perdi-me na profundidade de seu
olhar, azul como o céu, um olhar que me levava a viajar em sonhos exímios.
Nossas mãos,
entrelaçadas; nossas bocas, abraçadas; nossos corpos, unidos. Um Paraíso vivido
em atos sagrados, corrompido em deliberado pecado. Corpos como instrumentos,
tocando a melodiosa canção do amor.
Meu pescoço virou o
alvo de seus lábios. Com lambidas quentes, ele me fez gemer. Com um único
sussurro, me fez arfar.
— Eu te amo,
Lienne.
Agarrei forte em
seus cabelos e trouxe sua boca de volta à minha. Mordi seus lábios, o apertei
junto a mim, com um medo inexplicável de perdê-lo de repente.
Após alcançarmos o
clímax do prazer, nossos corpos explodiram em busca de ar. Sua cabeça repousou
em meu colo e eu o acariciei na face. Um demônio e seu anjo. Dois amantes
invertendo as posições. Prendendo-me em um forte abraço, ele clamou:
— Nunca morra,
anjinha. Seja minha para sempre.
Eu seria, enquanto
o “para sempre” durasse. Porém, o
sempre nunca nos daria o “para sempre”.
Anjos choram, e a
Nova Ordem também conhecia as lágrimas, porque ambos choramos...
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